A União Africana e a União Europeia assumiram, terça-feira, em Luanda, a aposta comum em continuar a caminhar juntas na defesa do multilateralismo baseado nas regras internacionais, como garantia da confiança criada ao longo dos 25 anos de parceria estratégica.

A renovação do compromisso foi sublinhada pelo Chefe de Estado angolano e Presidente em funções da União Africana, João Lourenço, e o presidente do Conselho Europeu, António Costa, em conferência de imprensa, que serviu de balanço da 7.ª Cimeira União Africana – União Europeia.

“Esta parceria vai ajudar os nossos países a se desenvolverem e a criarem melhores condições de vida para os nossos povos. Estamos a dar o sinal contrário àquele que, infelizmente, estamos a ver ultimamente no mundo, em que o unilateralismo está a procurar suplantar o multilateralismo. Estamos a dar a indicação de que o caminho a seguir é defender o multilateralismo”, adiantou-se a assegurar o Presidente João Lourenço.

“Do meu ponto de vista, vamos continuar a trabalhar juntos pela paz e prosperidade através do multilateralismo. É muito claro que a nossa parceria é baseada nos nossos valores compartilhados e no apoio comum para uma ordem multilateral e uma ordem baseada nas regras internacionais”, acrescentou António Costa, esclarecendo que a confiança na parceria África – Europa assenta, também, em projectos concretos.

“A visão que temos é que o maior e melhor recurso que a África tem é o seu capital humano, o seu talento, e a sua juventude. Nos próximos anos, entrarão no mercado de trabalho no continente africano 800 milhões de pessoas”, perspectivou.

Para o líder da União Africana, a grande lição que se pode tirar da Cimeira de Luanda e das anteriores, é o valor que se presta e se dá à parceria entre os diferentes blocos continentais. “Quando vivemos, hoje, num mundo em que existe uma confrontação que vai ao extremo, levando até a guerras, o exemplo que pretendemos dar com estas Cimeiras é que, em vez da confrontação, preferimos a parceria”, acentuou.

E a melhor garantia desta parceria estratégica entre a União Africana e a União Europeia, reforçou o estadista angolano, é a confiança criada ao longo dos últimos 25 anos entre os dois continentes.

“Portanto, existe confiança e na base desta mesma confiança, em princípio, consideramos haver garantias de sucesso desta cooperação entre os dois continentes”, assegurou, convicto, João Lourenço.

Oportunidade extraordinária

O presidente do Conselho Europeu considerou a Cimeira de Luanda uma oportunidade extraordinária para que a África se desenvolva não só com base nos seus recursos naturais, que são essenciais para a transição energética ou para a transformação digital, mas, também, continue a atrair investimento para se industrializar.

António Costa considera que o continente deve transformar localmente os seus recursos naturais, para que o valor acrescentado que se gerar se fixe em África e sejam criados empregos para a juventude africana.

“Essa é a visão de parceria que a União Europeia tem com a União Africana e que os Estados Europeus têm com os Estados Africanos. As empresas europeias são o primeiro investidor em África e estamos convencidos que a criação da Zona de Comércio Livre Continental Africano vai potenciar esse desenvolvimento e os investimentos que temos estado a fazer com base na iniciativa do Global Gateway”, sublinhou.

A ideia defendida pelo líder do Conselho Europeu é que o crescimento africano seja em infra-estruturas fundamentais para os corredores de desenvolvimento, mas também na formação profissional e no investimento em áreas industriais críticas como das vacinas, que considerou “essenciais para garantir que esta parceria seja desenvolvida numa base de mútuo interesse e não numa lógica extractivista como ocorreu em séculos anteriores”.

“Nada está acima da soberania dos povos”

João Lourenço ressaltou não haver nada que esteja acima da liberdade, independência e soberania dos povos. O Presidente da União Africana recordou que enquanto os países africanos estavam colonizados por algumas potências europeias, o principal país que nessa altura se levantou em defesa e contribuiu para que os africanos pudessem alcançar as independências foi, sem sombra de dúvidas, a Rússia, quando antes estava integrada na então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).

“Na altura, com outra designação, ainda era a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Foi a potência que, no quadro da Guerra Fria, ajudou os nossos povos a se libertarem do colonialismo europeu”, disse reconhecido o estadista angolano, sublinhando que o apoio se consubstanciou no fornecimento de equipamento, armamento e formação militar dos homens, permitindo o alcance das independências.

“Os povos africanos, que beneficiaram dessa ajuda, estão eternamente gratos à Rússia por este apoio”, reforçou João Lourenço.

Quanto à guerra na Ucrânia, a África defende a justiça e princípio da Carta das Nações Unidas.

“Por defendermos a justiça e princípios, defendemos, a exemplo do que se passou connosco, o direito à independência, à soberania e à integridade territorial da Ucrânia”, esclareceu.

Apoio à paz justa nas guerras e conflitos ao redor do mundo

O presidente do Conselho Europeu, António Costa, sublinhou que os pontos constantes na Declaração Conjunta da Cimeira de Luanda são esclarecedores em relação aos objectivos pretendidos pela União Africana e a União Europeia com a parceria estratégica estabelecida há 25 anos.

Em resposta aos jornalistas, na conferência de imprensa, o líder europeu referiu que os pontos número 4 e 5 da Declaração de Luanda são, também, elucidativos quanto ao apoio dos blocos continentais aos valores das Nações Unidas.

“Dizemos que somos guiados por essas regras e princípios, reiteramos o nosso apoio para uma paz justa, compreensiva e duradoura na Ucrânia, bem como no território ocupado da Palestina, no Sudão, na República Democrática do Congo, no Sahel, na Somália e nas outras guerras e conflitos ao redor do mundo”, disse.

António Costa alertou, no entanto, que nos tempos actuais não existem conflitos locais, nem regionais, sublinhando que todos esses conflitos, no Sudão, na RDC, em Gaza ou na Ucrânia, não são locais, nem regionais, afectam toda a humanidade.

“São violações da Lei Humanitária e dos valores inscritos no sistema das Nações Unidas”, acrescentou o português, esclarecendo que quando se permite que um Estado, seja qual for, desrespeite a integridade territorial e as fronteiras internacionais reconhecidas de outros países, “estamos a permitir que todos os outros países façam o mesmo”.

Essa é a razão, justificou o presidente do Conselho Europeu, para a aposta na ordem multilateral baseada nas regras internacionais. “Porque a alternativa é simplesmente o caos. Precisamos evitar o caos, apoiar a ordem internacional na Ucrânia, na RDC, em Gaza e no Sudão”, acentuou.

No ponto 5 da Declaração de Luanda, citado por António Costa, os dois blocos destacam os princípios defendidos pela ONU, assentes no reforço das parcerias para a segurança alimentar, agricultura sustentável e pesca, a reafirmação do Acordo de Paris e compromisso com metas climáticas globais, bem como o reconhecimento de que a acção climática é, ainda, insuficiente e deve acelerar o acordo que promover a economia azul e combate o tráfico de espécies, pesca ilegal e poluição.

Os desafios das infra-estruturas, energia e digitalização, referenciados pelo líder europeu no ponto 4 da Declaração final, estabelece o acordo para acelerar investimentos em energia verde, transportes e infra-estruturas digitais.

A União Europeia destaca, ainda, o apoio ao Corredor do Lobito como projecto-chave, ao mesmo tempo que defende investimento em electricidade limpa para 100 milhões de africanos até 2030, e compromisso conjunto com a União Africana na transformação digital, bem como na Inteligência Artificial confiável e literacia digital.

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